segunda-feira, 22 de outubro de 2007

Ditadores e Presidentes

Aproveitando o ensejo do excelente artigo da Carol Marossi sobre as mulheres chinesas, vamos falar um pouco sobre alguns chefes de Estado mal vistos pelas potências ocidentais e a denominação que recebem pelos veículos de comunicação. Os exemplos clássicos são Fidel Castro e Hu Jintao.
Ambos são oficialmente presidentes em seus países, mas Fidel Castro comumente recebe o título de ditador, ao passo que Hu Jintao, o de presidente.
Tanto num como noutro, determinadas práticas das democracias liberais são ignoradas, como sistema eleitoral pluripartidário, liberdade de organização e livre manifestação de opinião.
Então por que a diferença de tratamento?
O motivo é evidentemente econômico. Cuba ainda permanece oficialmente socialista, apesar de vir adotando medidas liberalizantes nos últimos anos. Já a China sempre que pode exige o reconhecimento de um “socialismo de mercado” e é recebida de portas, braços e bolsos abertos pelas potências ocidentais.
Alegarão os incautos que Fidel Castro está no poder há mais de 40 anos e que na China ocorrem mudanças no comando do poder com certa periodicidade. Ora, isso é apenas parte de uma situação muito mais complexa, afinal, no Brasil tivemos 5 “generais presidentes” e não são poucos os estudiosos e jornalistas que classificam o regime militar como ditatorial. A “rotatividade no poder” merece um exame minucioso, pois não se sustenta apenas por sua existência oficial.
Isso impõe uma reflexão séria. Temos, com isso, a submissão do conceito político ao modelo econômico. Mesmo que em Cuba já existam grandes redes de hotéis multinacionais e um mercado paralelo, não há como comparar o processo vivido pela ilha com o do gigante oriental. A China está num processo de abertura econômica selvagem, cujo paralelo só tem lugar com a Revolução Industrial - em que um rápido processo de acumulação de capital liberou as forças produtivas e engendrou as classes fundamentais do capitalismo contemporâneo: a burguesia e o proletariado. Ou com o Imperialismo (ou Neo-Colonialismo) - quando a África foi partilhada e explorada até os ossos pelo Ocidente e a própria China foi objeto de “zonas de influência”. Daí seu atual processo de “brasilianização”, como se referem alguns críticos ao crescimento estratosférico concomitante ao alarmante aumento na desigualdade social.
Entretanto, a diferença fundamental reside no aspecto ideológico incorporado por seus dirigentes. Fidel Castro coloca-se como defensor do socialismo e, sempre que pode, denuncia as iniqüidades do sistema capitalista. Já Hu Jintao posiciona-se como um agente de negócios, pronto para abrir as portas de seu mercado controlado com mão de ferro.
Para usar as palavras de Hannah Arendt, na obra “As Origens do Totalitarismo”, a China caminha para uma concepção de vida burguesa, cuja característica não se resume a ser uma classe proprietária, mas considerar que “todos podem pertencer a ela, contanto que concebam a vida como um processo permanente de aumentar a riqueza e considerem o dinheiro como algo sacrossanto que de modo algum deve ser usado como simples instrumento de consumo”.
Com isso, os dirigentes chineses recebem de seus congêneres ocidentais e da imprensa em geral o pomposo título de presidentes, ainda que violem certos princípios liberais – exceto o principal, é claro.

7 comentários:

Carol M. disse...

Excelente, garotinho- avon! Precisamos discutir esses aspectos em uma mesa de bar, *risos!

Beijo.

Elton disse...

Sem dúvida, Carol!

Ministro Puskas disse...

A China é aceita pelo simples fato de fazer aquilo que o neoliberalismo prega. Esse negocio de democracia e liberdade de mercado nunca deu certo, salvo na mente perturbada de alguns lideres mundiais ocidentais. Pena que o conflito entre a entidade cosmica "mercado" e a deusa dos "direitos iguais" ainda não foi percebida pela classe media (mediocre?)

Tio Vinix disse...

Vc tinha razão sobre o seu texto Elton. Concordo plenamente.

Ô Ministro, classe média não existe, isso coisa que contam pra assustar criancinha antes de dormir

Julia disse...

Excelente texto mesmo, só posso dizer "afff" pra quem chama o comandante da china de "presidente"... Alguém viu o filminho da "eleição"? Demais, engraçadíssimo!

salvaterra disse...

o principal, é claro, é tudo o que importa. nosso mundo é bonito de se ver né?

Ministro Puskas disse...

Julia, aquele que mostra uma eleição em uma escola primaria?