quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Em ritmo de festa!

Carnaval chegando e a folia tomando conta da galera. Enquanto isso os políticos do grande estado de São Paulo vão praticando o velho nepotismo, mesmo depois de atacado duramente na mídia, há pouco tempo atrás. Pegaram um juiz do Tribunal de Contas do Estado que desviou aproximadamente quinze milhões para uma conta nos Estados Unidos. Como se não bastasse, cinco de suas filhas trabalhavam em cargos de confiança dentro de seu escritório, ganhando cerca de doze mil reais cada uma, para corrigir erros de português na documentação emitida de responsabilidade de seu pai. Pois é, doze mil para corrigir erros de gramática, ao mesmo tempo em que professores formados ganham por volta de mil e quinhentos reais (nas capitais do sudeste)! Dizem que o governador Serra não sabia disso, afinal o caso do desvio vem ocorrendo desde os tempos do Fleury, ou seja, a muitos e muitos anos. Deixando São Paulo e voando até o Planalto, ouvimos o grande humorista Lula chamar o desmatamento da Amazônia de apenas uma “feridinha, nada de um câncer como falaram”. Deixemos então, quem sabe a feridinha não cicatriza sozinha, não é? Afinal, como disse um certo senador do Amazonas, os dois milhões de habitantes que vivem nas áreas da floresta têm todo o direito de serem felizes. Desmatar, queimar e transformar em pasto os terrenos de grilagem para ampliar o rebanho de gado, vender a madeira para a Europa e desenvolver economicamente o país é o lema dos políticos que defendem os interesses da região. Em primeiro lugar o crescimento do PIB, mesmo que isso signifique miséria, seca e enchentes pelo território. Aproveitemos o Carnaval enquanto ainda podemos...

quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

Quarta meiaEntrada - O Básico da MPB III

NOVOS BAIANOS


"Acabou Chorare"
Esse é um clássico, talvez o mais básico entre os “básicos” dessa lista. Tem muito de João Gilberto nesse disco, muita influência e, diga-se de passagem, é muito melhor ouvir quem pensa em João Gilberto do que ouvir o que o João pensa. É disco mais comedido do que muitos pensam (incluo aqui pra fazer parzinho com as mocinhas de saia rodada e todo o resto que eu to de saco cheio de repetir, mocinhos que falam manso, tem a barba malfeita e cabelo comprido e que também usam pouca maquiagem entre os que pensam, se é que pensam). Uma boa pra você soltar numa rodinha repleta desses mocinhos e mocinhas é que a influência do João foi muito mais direta do que se imagina, pois na época desse disco a maior parte dos Novos Baianos morava no rio, no mesmo hotel onde morava o João e eles trocaram muitas informações musicais durante a gravação de “Acabou Chorare”. Os violões mais contidos nesse disco (perceba ao ouvir, a suavidade da faixa que dá título ao disco) refletem essa troca de informações. Aproveite também e mostre aos mocinhos de fala mansa, barba mal feita, cabelo comprido e pouca maquiagem que você não se limita a ficar fechado no Brasil e que sabe que esse disco também é considerado o melhor disco de música brasileira de todos os tempos pela Rolling Stone. Desse disco é possível dizer também que há a ratificação do termo “Baianidade” e todos as suas ramificações, para mal e para bem. Merece bastante atenção a versão de “Brasil-Pandeiro” (um samba dos anos 40 do também baiano Assis Valente), a magnífica “Mistério do Planeta, talvez a melhor composição da banda, e a clássica “Preta Pretinha”. O Pepeu Gomes estava na melhor fase dele, é só isso já seria o suficiente pra torna “Acabou Chorare” básico.
Outra curiosidade: O título do disco e da faixa dentro do disco se refere a filha do Galvão (letrista da banda), que vivia junto com o Novos Baianos, que por sua vez vivam juntos de muitos bolivianos, chilenos e outros latino-americanos, numa espécie de comunidade Hippie. A menina, na época com 2 ou 3 anos aprendia suas primeiras palavras em português e castelhano ao mesmo tempo, fazendo uma mistura das duas línguas, adicionada a sua própria interpretação criativa. Numa manhã, a menina se assustou ao ver uma abelha entrar em seu quarto. Socorrida pelo pai, ao se acalmar dizia a ele: “acabou chorare, pai”. A letra da música é justamente uma brincadeira com o modo de falar de menina.

sábado, 26 de janeiro de 2008

Porque hoje é sábado

[Um flerte com o mundo real ou o descanso do exílio].
Na verdade ela não queria que eu criasse nenhuma expectativa. Nem eu próprio. Deixe os dias escorregarem devagar entre os dedos, era o mantra que eu vinha entoando nos últimos meses, desde aquela noite chuvosa, cheirando à carnificina.
Mas tudo é tão inútil. Sofro de males terríveis. Suporto somente as mentes mais brilhantes. E ela era invariavelmente genial. Mesmo - e principalmente - quando me atropelava com as palavras mais tenebrosas sem motivo algum.
Tentei me precaver. Daqui de dentro tomei medidas preventivas, abstive-me do velho pânico. Mas sou tão arrogante nas minhas escolhas, os bons scripts sempre me caem bem: luvas tateando cada milímetro do meu espírito. Daí que nos enroscamos fácil entre conversas, sambas e cervejas. A mesma cadência. Eu podia ouvi-la por quilômetros. Ela exalava desejo. Eu também.
Mas ela sofre de males terríveis e eu não tolero realidades. Nos envolvemos fácil, ainda assim. E os dias passaram simples, únicos, maravilhosos. Havia um acordo tácito nos olhares; silêncios nos abraçavam bem.
Aqueles olhos castanhos, os lábios hábeis e o sorriso claro acomodavam minhas inquietações. Então eu me declarei. Abandonei todas as precauções, o mantra, o velho pânico.
Quando percebi a cadência havia mudado. E parou. Ela buscava olhos azuis, tão blasé, num passado próximo. Tão surpreendente, essa moça. E eu ainda espero palavras revestidas de atitude. Estacionado aqui, pela terceira vez nessa semana. Mas não as peço.
Talvez ela venha. Não venha. Amanhã, depois, talvez. Através das sombras.
Daqui 48 horas não vai mais lembrar de mim e silêncios não funcionarão. Nada deveria ter acontecido - nunca.
É a praxis. Relações que se iniciam com encantamento passam. Voláteis, como o primeiro gozo.

Trecho do meu primeiro romance, "O avesso de Pandora", em fase de execução.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Movimento Estudantil

Faço aqui algumas observações pessoais sobre o movimento estudantil hoje no Brasil. Baseio-me nos 4 anos de vida acadêmica no curso de história da USP.
Divido o movimento estudantil de modo esquemático em 3 grandes grupos. Os que pertencem a organizações políticas e/ou partidárias, como PSOL, PSTU, PT, PC do B, PCO, NN (Negação da Negação), LER-QI (Liga Estratégica Revolucionária – Quarta Internacional); os Anarquistas; e os Independentes.
Na maioria das vezes que pude observar, a direção do movimento foi disputada entre os membros de organizações político-partidárias e os anarquistas. Coube a esses dois grupos a iniciativa de ações concretas, as falas ao microfone e a defesa de propostas. Isso se explica devido à formação intelectual mais sólida que eles possuem, pois, para defender uma ideologia ou uma agremiação política de modo vigoroso como fazem, devem dominar de modo razoável a literatura política, e muitas vezes já estão acostumados a debates internos dentro de seus grupos. Os independentes compõem um grupo bastante heterogêneo, que abrange conservadores querendo fazer média com os colegas, antigos membros ou simpatizantes de partidos desiludidos com a agremiação (ex-petistas, principalmente), uma minoria de tucanos e democratas enrustidos tentando conduzir, sem efeito, o movimento nos bastidores, os angustiados que não sabem o quê defender mas sabem contra o quê lutar e os oportunistas que aparecem nessas ocasiões mais para xavecar alguém ou fazer amigos do que pela causa em si. Os independentes são essenciais para compor o movimento, pois lhe dão corpo e expressão numérica. As ramificações e subdivisões nesses grupos são praticamente infinitas, mas há uma forte tendência anarquizante no movimento, dado principalmente pela força que os próprios anarquistas ainda têm e a desconfiança que grande parte dos independentes possuem em relação às agremiações políticas. Se na década de 60 era fácil fazer uma lista de lideranças estudantis, dificilmente temos hoje alguém que poderia se enquadrar nessa categoria. Vladimir Palmeira, José Dirceu e José Serra (que coisa, hein?) já eram conhecidos quando agitavam a cena política nacional (devido à publicidade gerada pela perseguição que sofriam dos militares e pela representatividade de que desfrutavam as entidades estudantis com suas bases) ao passo que hoje, apesar das ocupações de reitoria que se espalharam pelo país, não temos um grupo que possamos chamar de líderes do movimento. O próprio conceito de “ação direta” está muito mais atrelado ao movimento anarquista do que socialista ou comunista. Sendo os últimos compostos por organizações na maioria das vezes extremamente hierarquizadas e, conseqüentemente, dependentes de uma cúpula, a desconfiança que os Independentes e demais estudantes depositam sobre os comunistas e socialistas vinculados a organizações é enorme. As próprias assembléias e comissões implementadas durantes os processos de luta também têm características anarquistas: geralmente são abertas a qualquer um que queira participar. As conseqüências são basicamente duas:
Primeiro, estrategicamente a ausência de lideranças torna o movimento mais dinâmico, posto que, se um membro cai, a renovação é menos dolorosa, pois não ocupava um cargo essencial para o processo. Além disso todo ano tem Vestibular e um número pequeno mas bastante ativo de descontentes entra na Universidade.
Segundo, o processo se torna mais dinâmico porém mais caótico, pois não possui uma orientação clara a não ser o posicionamento contrário a determinada situação. Por exemplo, contra os decretos de José Serra, ou contra a reforma universitária do governo Lula. Fora esses pontos em comum, as divergências entre Político-Partidários, Anarquistas e Independentes são enormes. De qualquer maneira, considerando que se vive uma “crise das utopias” e que a juventude hoje é caracterizada como apática, deu pra ver que o movimento estudantil é muito mais rico e complexo do que faz supor uma observação despreocupada sobre as manchetes da TV, dos jornais e das revistas.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Quarta MeiaEntrada - O básico da MPB II

Antes de dar continuidade ao listão do tiozão, uma correção (aeee Elton!!!): O disco com um pão na capa do Chico Buarque que eu citei no últimos post se chama “Chico Buarque en Español” e logicamente tem suas músicas em espanhol, não em italiano, como eu erroneamente tinha dito.
Agora, voltando ao básico e aproveitando o gancho:


CHICO BUARQUE




“Almanaque”

Esse é o grande disco do cara. Os clássicos mais famosos dele não estão aqui, mas essa lista não é lista de perfumaria, pra você sair cantando “Cotidiano” e achar que manja de Chico, aqui a brincadeira é séria. A importância desse disco está no seu todo. Ele é todo bom e, não sei se conscientemente, faz um perfeito resumo da capacidade do Chico como compositor. Tem um samba que é uma crônica social pitoresca (Meu Guri), tem as canções de amor com o acabamento estético que só o Chico sabe dar (Vitrines e Moto Contínuo) e tem o som mais particular que, a partir justamente desse disco de 1982 viria a ser o tipo de som que caracterizaria o Chico Buarque consagrado como Mito, não mais só como estrela da MPB. Prova disso nesse disco são a canções “Ela é Dançarina” e “Tanto Amar”, cuja forma de arranjo e estilo seriam as bases para a concretização de álbuns como “Chico Buarque” de 1989 e “Paratodos” de 1994, o ápice do Chico-Mito. Daí pra frente ele entra em queda livre, mas isso é assunto pra outro post. A virtude de “Almanaque”, contudo, é ser o disco que antecede o Chico-Mito, ou seja, antes de onze entre dez mocinhas de saia rodada, sandália e pouca maquiagem dizerem que dariam (a vida) pro filho do Serjão. Nessa época o cara ainda era obrigado a mostrar que era bom e tudo mais, aí você tem um disco muito mais bem acabado do que os posteriores. Ainda nesse disco você tem o Chico-Malandro, aquele compositor de sambinhas fáceis e populares que caiam na boca do povo e que foram deixados em segundo plano, quase esquecidos a partir da segunda metade dos anos de 1980. Eis nesse disco uma deliciosa amostra desse lado do Chico, com “Amor Barato”. Portanto, por ser um disco de transição na forma do Chico compor e por isso trazer junto quase todas as facetas do homem, esse disco é básico.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

Mais Literatura Africana - Angola (II)

Último texto da prova de Africanas I que fiz na Letras. Quem não tiver paciência, pule para a conclusão. É o parágrafo que começa com "Por meio dessas três histórias..."

2ª Questão – Compare as formas de representação e organização dos espaços urbanos na novela "Nga Muturi", de Alfredo Troni, no conto “A menina Vitória”, de Arnaldo Santos, e no conto “Vavó Xixi e seu neto Zeca Santos”, de Luandino Vieira.

Os três autores trabalham com polaridades espaciais bem definidas, que acabam, por fim, caracterizando a inserção social de suas personagens.

Para Alfredo Troni (1845-1904), os pólos fundamentais consistem na terra do Muene Putu (rei, chefe ou senhor) e no mato, o universo rural e tribal de origem de Nga Muturi. A ascensão social da personagem pode ser vista por meio dos locais que habita e freqüenta ao longo da narrativa. Das cubatas de sua terra natal, onde é negociada e vendida como escrava para pagar as dívidas de um tio, passa a viver numa libata , até que um comprador a leva como mucama. Vive na libata de seu senhor, que adoece e parte para Luanda, onde passam a morar num sobrado, que é também uma loja.
Os espaços são fracamente descritos, e nada sabemos da arquitetura, composição dos materiais ou mobiliário em geral. Porém são dotados de significados profundos na vida de Nga Muturi, pois cada recanto lhe traz uma lembrança marcante. No pátio, por exemplo, foi amarrada a um mastro e chicoteada pelo patrão. No beco avistou Chica e Serra namorando. Na camarinha deitava-se com o patrão e, certo dia, lhe fez um feitiço para que engravidasse dele: abriu um buraco no colchão na parte de baixo e lá colocou pés, ossos e a cabeça de um galo, o que, depois de descobertos, lhe valeram uma surra.
Com a morte do senhor, Nga Muturi herda dois contos de réis e o sobrado, marcando definitivamente sua mudança de classe.
A missa, e principalmente as missas, dão o tom da organização sócio-espacial da sociedade luandense do período, marcado por uma convivência forçosamente tolerante entre brancos e negros, mas ainda assim profundamente preconceituosa. Durante oito dias, Nga Muturi celebra missas no sobrado, para onde se dirigem desde o delegado e filhas de tenente-coronel até os amigos e conhecidos próximos, como o Serra, todos ávidos por participar e se divertir nos batuques.
Invejada e detentora de capital, Nga Muturi agora empresta a juros e penhora bens alheios. É madrinha de Mariquinha, moradora do musseque Spínola, aonde vai visitá-la com certa freqüência e, comparando “a sua existência na libata com a que leva agora, diz de si para si que a terra do Muene Putu é muito melhor que o mato.”

Arnaldo Santos (1935), em A Menina Vitória, trabalha com os pólos Beira Alta, um dos departamentos de Portugal, e o Kinaxixe, região rural marcada por um lago e com conotações místicas. Embora também se trate de uma família que ascende socialmente, a história se concentra na formação identitária do menino Gigi, em conflito permanente com a professora Vitória, que, junto com os pais, lhe poda os costumes e influências da convivência com os meninos pobres, seus amigos. Dessa forma, a escola é o espaço da opressão, ao passo que as ruas, o da liberdade. Num local é reprimido, ofendido e espancado; no outro é alegre, espontâneo e vivaz.
O espaço é essencialmente marcado pelas palavras utilizadas para descrevê-los. O principal conflito que Gigi trava com Vitória, mulata formada na Metrópole, é justamente por conta das expressões em quimbundo que utiliza nos textos. Cada vez que se esforçava em decorar as palavras em português, substituindo o quimbundo, “esvaziava-se das pequeninas realidades insignificantes que ele vivia, das suas emocionantes experiências de menino livre, agora proibidas e imprestáveis.”
No entanto, o alvo predileto da ira de Vitória é o colega de classe Matoso, cafuzo e de mesma origem social. O sentimento de hostilidade ao menino é espacializado num “círculo intransponível de desprezo, onde ele já não se debatia, nem chorava.” Matoso ocupa o fundo da sala, e Gigi, ao ter as mãos castigadas pela palmatória, chora de raiva e vergonha, mas afirma-se como indivíduo perante o poder, ao exibir “os olhos secos, enxutos, e orgulhosamente raiados de sangue, como os de Matoso.”
Percebemos na sala de aula uma geografia do poder perversa e preconceituosa, em que os alunos brancos sentam-se próximos à professora, enquanto os mais escuros, ao fundo.

Em “Vavó Xíxi e seu neto Zeca Santos”, os pólos fundamentais que Luandino descreve se constituem no musseque e na Baixa. Vavó Xíxi e Zeca Santos habitam um musseque qualquer; no fundo, o nome do bairro não importa: a história de vida de ambas personagens se repete em todos os musseques de Luanda.
Com o pai encarcerado acusado de “terrorismo”, Zeca Santos tem a difícil empresa de sustentar-se a si e Vavó Xíxi. Estigmatizado pela origem social, é negado nos empregos que procura. Quando vai à Baixa e nos escritórios de contratação lhe perguntam onde nasceu – Catete, patrão! – logo é posto para fora, sob ofensas, pontapés e chapadas. Território que lhes é profundamente hostil, é na Baixa, entretanto, que buscam a sobrevivência. De lá Vavó traz os restos recolhidos nas ruas sem árvores. Para lá Zeca Santos vai em busca de emprego no posto de Sô Souto, que o recebe a chicotadas e insultos, dizendo-o filho de terrorista. Lá consegue emprego de carregador de cimento, ao custo de repassar uma parte do salário a um intermediário. Finalmente é lá, na Baixa, que se encontra a fábrica em que trabalha Delfina, por quem é apaixonado e que, apesar de lhe ter muito carinho, nega-se a viver com um desocupado.
Mas tampouco o musseque pode ser visto como um local agradável. Habitando uma cubata erguida sobre o chão de terra batida, quando chove, conforme anunciado no início da história e previsto por Vavó, a habitação é tomada pela água, transformando o solo em barro e derrubando os lares de moradores locais. A dor de viver num local tão pobre sem dúvida é sentida de forma mais intensa por Vavó Xíxi, cuja memória de sua casa, um sobrado, lhe vem à mente juntamente com seus dias de Dona Cecília de Bastos Ferreira, Nga Xíxi para as amigas e vizinhas, moradora da região de Coqueiros e Fortaleza, lembrança indelével de um dia de sol; bem diferente da cubata de um musseque qualquer, sem nome e totalmente vulnerável às chuvas que atemoriza os moradores.
Contudo, a realidade é o musseque, com o qual acabam se familiarizando, principalmente o neto Zeca Santos. Os bichos e plantas que povoam o local, os caminhos que de lá partem e para ali conduzem adquirem um colorido familiar ao menino. É nas áreas baldias situadas entre o musseque e a Baixa que Zeca Santos integra-se à paisagem, na tentativa de ganhar os carinhos de Delfina, cujo corpo, sequioso por possuir, aparece como único espaço reconfortante e seguro. Mas a ousadia lhe custa caro e a garota joga em sua cara a condição social humilde e desprovida. – “Você pensa que sou da tua família, pensa? Que sou dessas, deita no capim, paga cinqüenta, vem dormir comigo? Pensas? Seu sacana, seu vadio de merda! Vagabundo, vadio, não tens vergonha! Chulo da sua avó, seu pele-e-osso!...”
O temor de perder Delfina é agravado pela conhecimento que tem da existência de um concorrente: João Rosa, que, ainda por cima, possui um carro, ou seja, um espaço privado disponível para as investidas sobre a garota.
Com um emprego incerto e sem amor, retorna Zeca Santos ao musseque, onde o aguarda Vavó Xíxi. Varados pela fome, deliram e choram. Vavó condenando a atitude de Zeca Santos, que, sempre que arrumou emprego, terminou por gastar o dinheiro com bailes e roupas. Uma camisa amarela, xodó do garoto, era a gota d’água para a velha. A fome estava por todos os lados da cubata, que, à semelhança de suas barrigas, está vazia, sem mobília, sem comida, sem dignidade, no silêncio de um musseque qualquer de Luanda.

Por meio dessas três histórias, podemos perceber que os espaços que acompanham as personagens das narrativas são dotados de um significado esclarecedor do momento histórico em que foram escritos e ao qual se referem, e da perspectiva do autor sobre a realidade de Angola.
Em Nga Muturi, Alfredo Troni nos dá os pólos espaciais mato e terra de Muene Putu, que constituem, na verdade, locais de atraso e progresso na trajetória ascendente da personagem. O sincretismo de que dão testemunho as missas revelam tendência à crioulização, numa mistura cultural entre as tradições africanas e portuguesas.
Os pólos espaciais de “A Menina Vitória”, de Arnaldo Santos, são a Beira Alta e o Kinaxixe, regiões opostas no plano da colonização. A Beira Alta constitui uma região da Metrópole e o Kinaxixe, de Angola. É dentro desses dois universos que se dividem as influências sobre o menino Gigi, que no fundo representam a opressão e a liberdade. Trata-se já de um contexto em que se verifica o recrudescimento da segregação espacial do negro, promovida pelo governo de Norton de Matos, a partir de 1912, e mantida até o início da guerra de libertação, que estourou em 1961.
Já Luandino Vieira determina o musseque e a Baixa como os centros espaciais nos quais circulam Vavó Xíxi e Zeca Santos. Entretanto, não há uma oposição clara de valores entre um e outro, como se verifica em “Nga Muturi” e “A Menina Vitória”. Tanto o musseque como a Baixa são locais extremamente trágicos para as personagens. Empobrecidos devido à segregação espacial, que empurra os negros aos musseques, e mergulhados no contexto da luta pela independência, o conto é um relato contra a alienação que a busca desenfreada pelo estilo de vida ocidental burguês promove sobre a juventude, representada por Zeca Santos, que, desatento aos conselhos de Vavó Xíxi, não dá conta de prover a casa. Embora não sejam homogêneos, todos os espaços estão sujeitos a uma totalidade: a da dominação colonial.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Quarta MeiaEntrada – O Básico Da MPB

Aí, você, pobre mortal que ouviu a Nova Brasil FM esses dias e achou que tem umas músicas legaizinhas lá. Então, depois disso você resolveu que ia saber um pouco mais de MPB, já que o repertório da Nova Brasil se esgota em 2 dias... Aí você foi numa loja grande, tipo FNAC e chegou no vendedor “O maluco, tem MPB aí?” Aí o cara deu uma risadinha besta e falou “Teeeeem, tá aqui” e te apontou um QUARTEIRÃO de CD’s de todas as formas e cores e preços. Perceba que você ficou com duas opções: Ou vai no afã e leva tudo o que você já ouviu falar (tipo um Oswaldo Montenegro, um Celso Viáfora e um Benito de Paula, e pra fazer um média um disco do Chico com um pão na capa... Legal vai ser quando você chegar em casa e descobrir que nesse disco o cara ta cantando em ITALIANO), ou chora, com aquela cara de “fodeu!”

Calma.

Resolvi, do alto da minha arrogância, enquanto a inspiração pra um texto sobre o Caetano e o Chico que já ta virando lenda não vem, fazer um lista com o BÁSICO DA MPB PARA INICIANTES (Música Triunfal ao fundo)!!!! Uma lista com os discos mais relevantes do gênero, pra você procurar, ouvir e saber se a sua praia é MPB mesmo.
Algumas questão latentes:

Eles serão fáceis de achar? Nem sempre, mas a maioria é clássico ou seja, está em catálogo.

É muita velharia? É. Se você acha que o supra sumo da nata da fina-flor da MPB é a CÉU, porque é toda modernosa, nem termina o texto.

Dá pra eu botar uma banca ouvindo todos eles? OOOOO SE DÁ. Sim, dá pra você chegar na baladinha e se gabar com a mocinhas na boa. Ao contrário também, mocinhas. Agora vamos aos discos, que eu vou numerar, mas só por organização, pois pra mim eles tem relevância quase igual.

1- Itamar Assumpção






"Beleléu Leléu Eu"


Olha que legal pra se fazer: Você ta numa festinha e começa a conversar com uma mocinha, toda bonitinha. Ela chega pra você, e como a sua sandália, sua saia rodada e sua pouca maquiagem denunciam, diz que gosta de MPB. Você acha super legal ela gostar de MPB, ainda mais agora que você começou a achar graça no bagulho. É fato que com o apoio de uma mocinha bonitinha de sandália, saia rodada pouca maquiagem você vai se interessar muito mais pelo tema. Mas a mocinha percebe que você não conhece muito de MPB e começa a se crescer ( mal dessas mocinhas de sandália, saia rodada e pouca maquiagem) e você começa a se apequenar... Até lembrar da dica do Tio aqui e perguntar pra ela assim: “E o Primeiro disco do Itamar Assumpção, não é mó legal?” Você vai ver: As expressões dela vão variar de “????” a “?!?!?!?!”. Claro, se ela falar “Claro, inclusive os vocais da Vânia Bastos são muito bons” aí você pára. Pára e ouve, porque essa mocinha de sandália, saia rodada e pouca maquiagem que você encontrou tem algo a dizer. Mas é raro, posso garantir.
Agora parando de graça e falando um pouco sério, em 1981 quando esse disco foi lançado, não fez sucesso. Alguns anos depois do seu lançamento também não. Quando Itamar veio a falecer em 2003, ele continuou sem fazer sucesso. E pelo jeito nunca vai fazer. Então se liga e vai atrás dele, porque esse disco é sim um dos mais importantes da música brasileira. Pela inovação na temática urbana das composições, pela teatralidade das interpretações, pela complexidade dos arranjos. Cada música é uma aula de como se fazer um bom disco utilizando todos os elementos regionais misturados com as novidades dos gêneros de sucesso ou seja, exatamente o que a geração mais recente da MPB faz hoje em dia. Esse disco é base pra formação de vários artistas direta ou indiretamente, entre eles Cássia Eller, Titãs, Zélia Duncan, Zeca Baleiro, Chico Cesar, Mônica Salmaso, Karnak, a própria Céu. Fez parte do que do que foi chamado pela crítica de movimento, mas não o foi de fato: A Lira Paulistana. Nesse movimento também eram incluídos Arrigo Barnabé e Rumo por exemplo. Mas esse disco foi com certeza o mais importante desse movimento que não foi. Dançante, divertido, delicioso. Obviamente básico.

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Terça Mochilão

A Colunista encontra-se no Marrocos, meditando sobre a existência de vida após o Mestrado, e promete voltar em Março. Obrigado

quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

Alguns escritos nunca perdem seu valor

Não sei se é um momento de transição, entre o adulto e o adolescente, mas a verdade é que estou receoso de minha visão do mundo. Apesar de muitos considerarem a televisão uma porcaria e seus programas nada a acrescentar à uma boa cultura e educação, eu a vejo de um jeito um tanto pior. Vejo as manias e comportamentos que ela difunde sobre os adolescentes e acho isso tão horrível, hipócrita, que se paro um instante e mergulho numa lógica que meus pensamentos atribuem a tv, acabo chegando ao cumulo de temer a próxima geração. Fala sério, eu não sou nenhum velho, tenho aqui meus vinte e poucos anos e aceito muitas idéias que fariam meus pais ficarem de cabelos em pé, mas realmente é preocupante o rumo que as coisas vêm tomando. Vendo o famoso “Sex and the City” na televisão percebi que existem programas que geram um padrão comportamental sexualmente normal entre pessoas de média idade também. O sexo está em tudo, aceito-o de bom grado, mas não vamos partir para a apelação vá lá. Criticas são sempre bem vindas, Eça de Queiroz já afrontava a sociedade do XIX com seus escritos, e Nelson Rodrigues escancarava os pensamentos familiares entre os jornais, mostrando realmente a vida como ela é (era). Um adolescente, ao ler uma das apimentadas historias rodriguienses hoje em dia diria: Normal! Isso de certa forma é fabuloso, enfim estamos aceitando com naturalidade o que já era natural e ninguém queria. Mas, voltando aos programas, está surgindo entre a mídia a lição não de criticar, mas de forjar o certo, o normal, o atual. Eu imagino a cabeça de uma menina de 14 anos assistindo Malhação, ou mesmo o popular Sex and The City, e considerando os passos que precisa tomar para ser normal. Sei que muitas coisas lá ajudam, principalmente alguns debates que surgem em torno de assuntos polêmicos, mas espera um pouco, converse com esses indivíduos e verá que de críticos não têm nada. A Adolescência consome, consome de forma cada vez mais intensa e menos seletiva. Normal é ter aquela mochila da televisão, normal é aos 14 anos não ser mais virgem, ou então ser motivo de deboche. O adolescente sempre quer deixar o “titulo” de criança num passado distante, quer firmar-se como capaz de tomar as próprias decisões, mas veja como ele às escolhe! Vendo series de tv, filmes e romances um tanto quanto desprovidos de qualidade. Aposto minha vida que se em algum titulo de Harry Potter houvesse uma aventura em que o maguinho comesse a maguinha, dias depois filhas às centenas estariam perdendo sua virgindade. Mas qual o problema nisso? Oras, não sejamos tão hipócritas assim! Todos sabemos a tal curiosidade que permeia o imaginário do jovem, e o quanto ele é ávido por descobertas. Ele sempre busca mais, sempre vai um pouco além do conhecido (por ele). Os limites? É, sei que cabe aos pais o limite, ou um pouco da responsabilidade também aos educadores (em uma parcela infinitamente menor), mas qual a força deles frente à tv? A verdade está no amigo próximo, que já fumou, já bebeu, já fudeu e foi fudido, é ele quem continua vivo e experiente para tomar suas decisões (que quase sempre o leva a atos cada vez mais inconseqüentes), e jamais no caxias dos pais, do professor careta que provavelmente nunca fez nada por falta de colhões e agora tenta impedir o jovem de correr o risco e se dar bem. Pais com rotinas de 8 horas/dia de trabalho chegam em casa e não debatem coisas severas com seus filhos. O papel do educador vem ganhando cada vez mais espaço na definição de conseqüências e limites, mas como se apropriar disso? Primeiro de tudo, não cabe ao educador a repressão excessiva e nem o julgamento sumario e esmagador que faria-o ver o adolescente com um ar de superioridade. É necessário não julgar os erros do sujeito, apenas dar ferramentas que permitam-no ter uma maior consciência de seus atos e melhor definição do certo e errado (do seu próprio certo e errado). Não estou dizendo que tudo deve ser perdoado, quem me conhece sabe muito bem o que acho dos adolescentes, mas é minha função ensiná-los a ler algo de forma correta, a assistir algo de forma critica e é o que não está acontecendo hoje em dia. Julgar, todos nós julgamos, mas guardemos para si próprios o quão idiota consideramos o próximo, cabe aos pais o massacrante papel de repreender. E quanto aos “adultos” que são influenciados a buscar uma vida a lá New York Sex, onde não ter apego ao amor e não dar valor a si próprio é o lema, pensando apenas no quando será que vou sair com alguém? Com relação a esses sou bem sincero. Que o mercado de trabalho os consuma, que sumam em suas próprias vidinhas inúteis e violem-se cada vez mais. A própria natureza se encarregará de coloca-los em extinção; isso é claro se fizermos o nosso papel de educar.

* Escrito a muitos anos atrás...

quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

Tópico de fora

Esse blogueiro que aqui escreve está com problemas para desenvolver textos mais elaborados no momento, pois tem que se preocupar muito mais em explicar tudo que faz do que em fazer mais, sob o risco de ser considerado grosso, mal educado, insensível e outras ofensas do gênero, independente do que tenha feito antes. E também tem tido problemas pra entender como um motoboy que supostamente fazia furtos pode ser mais perigoso pra sociedade do que um Promotor que além de ter uma arma ilegal é também é um assassino declarado e ainda assim continua trabalhando normalmente.


Promotor mata motoqueiro com 11 tiros
Pedro Baracat Guimarães Pereira disse à polícia que reagiu a uma tentativa de assalto; não foi achada arma com o suposto criminosoSegundo o boletim de ocorrência, Pereira esperava a abertura do semáforo quando o motociclista anunciou o assalto

EVANDRO SPINELLILILIAN CHRISTOFOLETTIDA REPORTAGEM LOCAL VITOR SORANO DO "AGORA"


O promotor Pedro Baracat Guimarães Pereira, 42, matou o motoqueiro Firmino Barbosa, 30, às 22h30 de sábado em Moema (zona sul de São Paulo). À polícia ele alegou que reagiu a uma tentativa de assalto. Amigos e parentes negam que Barbosa fosse criminoso. Segundo o "Fantástico", da TV Globo, porém, duas pessoas o reconheceram como autor de outros assaltos ontem à noite.Peritos do IML (Instituto Médico Legal) dizem que o motociclista levou 11 tiros. A polícia não revela qual a arma utilizada pelo promotor, não confirma o número de tiros disparados nem se o acusado tinha ficha policial. A mulher dele está grávida de oito meses.A Folha apurou que a arma do promotor seria uma pistola 9 milímetros, de uso restrito das Forças Armadas, e que o suposto assaltante não teria antecedente criminal.O promotor não foi localizado ontem -recados foram deixados em seu telefone celular pela reportagem.De acordo com a Secretaria da Segurança Pública, após ter matado Barbosa, o promotor saiu do local (à polícia, declarou ter medo da reação de eventuais comparsas), avisou a Polícia Militar pelo telefone do ocorrido e se dirigiu ao Deic (Departamento de Investigações sobre o Crime Organizado), onde foi ouvido e liberado.Segundo o boletim de ocorrência, Pereira aguardava em seu carro, um Honda Civic, a abertura do semáforo na avenida República do Líbano, ao lado do parque Ibirapuera, quando Barbosa chegou em uma moto com placa apagada e anunciou o assalto.Barbosa, sempre na versão do promotor que consta do boletim de ocorrência, teria pedido o relógio de Pereira e levado a mão à cintura como se fosse sacar uma arma.O promotor, então, teria pego sua própria pistola e atirado. Não foi encontrada nenhuma arma com o motociclista.Já no Deic, segundo a secretaria, o promotor teria ficado sabendo que o motociclista foi socorrido policiais, mas morreu no hospital.Com Barbosa, a polícia declara ter encontrado cinco relógios -cujos modelos não foram divulgados. A moto dele e a arma do promotor também foram apreendidas.Segundo a polícia, duas testemunhas confirmaram a versão do promotor. Seriam moradores da região, mas os seus nomes não foram divulgados.A polícia não investigará o caso, diz a Secretaria da Segurança Pública, pois cabe ao Ministério Público apurar casos que envolvam promotores. O caso foi encaminhado ao procurador-geral de Justiça, Rodrigo César de Rebello Pinho.Pereira é membro do Grupo de Atuação Especial de Controle Externo da Atividade Policial e assinou uma denúncia contra Pinho encaminhada ao Conselho Nacional do Ministério Público acusando-o de favorecer o governo José Serra (PSDB) em investigações.Foi também um dos autores da denúncia contra 25 pessoas que seriam responsáveis pelos ataques do PCC em 2006.

Quarta MeiaEntrada - Pirata


Eu compro DVD’s piratas, compro mesmo. Não acho justo pagar R$50,00 num filme, que é o que a gente costuma pagar em média num filme original novo e não entendo como o mesmo filme, se não obtiver boas vendas pode em um ano passar do preço citado acima para... Hum... Uns R$7,99. Nos camelôs da Lapa eu pago R$5,00 por filmes que se você der uma boa procurada são bons e estão bem gravados. E também não caio naquela balela de financiamento do tráfico, pois se nós temos a opção de financiar ou não o crime da periferia, somos ao mesmo tempo, via impostos, obrigados a financiar o crime em Brasília, falta enormemente mais latente e vergonhosa. Pois lá na Lapa de Baixo, na passagem subterrânea que dá acesso a Rua 12 de Outubro, encontrei um camelô surpreendente. Ele é o único que eu conheço que tem alguns clássicos do cinema escondidos entre os lançamentos e shows de Forró e Música Evangélica. Da última vez que fui lá encontrei um dos melhores filmes do Scorcese a venda, “Táxi Driver”. De lá, já levei “Um Dia de Cão”, “Profissão: Repórter”, “Cães de Aluguel” entre outros. Vale a pena dar um procurada lá. E se você pechinchar, ainda leva três filmes por R$10,00 (aliás, como na maioria dos camelôs Lapeanos). Piratear filmes de arte não é uma inovação desse camelô da Lapa. Na Teodoro Sampaio também é fácil encontrar dois ou três vendedores de rua especializados em Cinema Europeu e Documentários, que vendem seus filmes a R$10,00 em média. Mas aí é classe média vendendo pra classe média. Nesses, eu só vou em caso de necessidade, e só compro se conseguir um desconto de pelo menos R$2,00 por DVD, porque lá o público é o mesmo que freqüenta a locadora 2001, o mesmo que vai no noitão do HSBC ( acho que o noitão acabou né?), o mesmo que acha que a pobreza acontece a tanta gente, que nem vale a pena ter pena da gente a quem isso acontece*, ou então monta um ONG, o que é pior. Nesse caso, prefiro ser cliente fiel do meu camarada do túnel da 12.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

Jornalismo, Liberdade e Justiça

Considerado por alguns um dos melhores jornalistas que o Brasil já teve, Cláudio Abramo (1923-1987) conseguiu um feito para poucos na área: manteve um espírito crítico ao ofício ao mesmo tempo em que ocupou cargos importantes em grandes veículos de comunicação. No livro “A Regra do Jogo”, temos, orientados por aproximação temática, uma seleção de textos do autor publicados na imprensa e intercalados por opiniões dele a respeito da profissão. Profissão que, aliás, ele preferia chamar de ocupação ou carreira. Responsável pela modernização dos jornais O Estado de S. Paulo e Folha de S.Paulo, ocupando o cargo de chefia da redação dos dois periódicos, nem por isso ficou cego às características peculiares do ambiente em que trabalhou.
“Em quarenta anos de jornalismo, nunca vi liberdade de imprensa. Ela só é possível para os donos do jornal. (p. 116)”
Quer mais?
“Também havia uma pressão muito forte contra mim por parte de oficiais do Exército que estavam conspirando com os Mesquita. (p. 93)”
“O fato de minha posição ideológica ser conhecida nunca atrapalhou em nada. Aliás, o dr. Julinho [Julio de Mesquita Filho] me queimava muito. Quando aquele pessoal que sempre conspirou visitava o jornal, ele, para exemplificar o liberalismo da casa, dizia que o secretário era trotskista.” (p.31)
“Houve um período em que não se podia acreditar em nada que saía impresso; era publicado nos jornais que um guerrilheiro tinha morrido atropelado, quando na verdade tinha morrido numa cela, sob as torturas mais bárbaras. (p. 120)”
Claudio Abramo não concebia uma terceira-via, mas buscava conciliar alguns aspectos das sociedades capitalistas avançadas e dos Estados socialistas.
“Inventaram que as ideologias morreram, mas as pessoas têm objetivos que se encaixam nesta ou naquela ideologia. O sujeito tem que ser comunista ou fascista. Não há meio termo.”
Haverá aqueles que verão nisto as marcas da guerra-fria, em que, de fato, um meio-termo era quase impossível. Porém, para além de seu tempo, entretanto, Claudio Abramo antecipou o dilema das esquerdas atuais, ao defender “a liberdade de manifestar-se, de fazer greve, de organizar-se em partidos, de estar ao abrigo das leis de exceção, de proteger-se eficazmente contra a autoridade abusiva do Estado, de ler o que quer, de pensar o que lhe der na telha, de viver como lhe apraz" ao mesmo tempo que um "Estado distributivo e coletivista".
Muitos afirmam que desde a queda do muro de Berlim as esquerdas estão buscando uma conciliação entre liberdade e justiça social. Tenho pra mim que se pode recuar ainda mais. Desde o relatório Kruschev, pelo menos, a questão foi posta e até hoje não se encontrou uma respota convincente. O jornalista também se encontra numa situação espinhosa, ao dividir-se entre a obrigação moral de informar para um mundo melhor, ao mesmo tempo em que sabe que o produto de seu trabalho é uma mercadoria, sujeita aos mandos dos patrões. Liberadade total e justiça social, assim clamou Claudio Abramo. Assim pedimos todos nós.

Mais literatura africana - Angola (I)

Aproveitando que o Ivan teceu alguns comentários sobre Mia Couto, emendo com um texto sobre José Luandino Vieira. É na verdade a resposta de uma das questões da prova de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa I, disciplina que cursei o último semestre na Letras, e que me surpreendeu muito, pela riqueza e pelo conteúdo. Hoje sou um pouco menos analfabeto em relação à literatura da África, continente que, infelizmente, ainda nos parece tão distante, apesar de nós tão íntimo.

3ª Questão – Como os contos de Luandino Vieira “O fato completo de Lucas Matesso” e “A história do ovo e da galinha” engendram a relação nação e utopia?

Membro do MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola), José Luandino Vieira (1935) transmitiu à sua obra literária boa parte das preocupações políticas que o movimento defrontou. Com o predomínio da estética neo-realista (ou real-socialista), diversas obras foram produzidas com o intuito de denunciar a exploração imperialista que os portugueses impunham sobre Angola, o processo de marginalização e alienação vivido pela população negra e a anomia social verificada num cotidiano marcado pelo preconceito e superexploração do trabalho do negro.
Dentro desse contexto, José Luandino Vieira, e diversos outros autores, buscaram afirmar a identidade angolana em suas tradições africanas, na esteira do movimento da “negritude”. Valendo-se da estética neo-realista, as obras literárias vinham carregadas de simbolismo político em suas personagens. O processo metonímico, em que a parte representa o todo, teve aqui solo fértil e prosperou. Não eram simplesmente personagens que habitavam Angola, num processo de individualização das características próprias a cada um, mas classes que representavam os dominadores e os dominados, os que se vendiam aos poderosos e os que lhes faziam frente.
Se, com isso, tem-se uma poderosa arma de propaganda, nem sempre se tem literatura de qualidade. O excesso de tipificação a que submeteram as personagens burguesas e proletárias, brancas e negras, homens e mulheres, velhos e crianças, muitas vezes recaiu no caricato e superficial. Felizmente não é esse o caso de Luandino.
Com efeito, como não poderia deixar de passar com um ativista engajado na luta de independência de Angola, os temas nação e utopia lhe são caros e fundamentais.
Em “O fato completo de Lucas Matesso”, acompanhamos toda a tortura que oficiais da repressão infligem sobre Lucas, que, preso e torturado, não consegue entender aquela história de fato completo de que os guardas tanto falavam. Ocorre que um dos policias ouvira a mulher de Lucas falar-lhe que traria, na próxima visita, um fato completo, e logo se instalou a dúvida no aparelho repressivo: estaria naquela vestimenta, o fato, o que tanto procuravam arrancar de Lucas Matesso?
Três meses de castigos, fome, pancadas e conversas sofreu, mas não cantou. O nome de Domingos não foi delatado aos guardas prisionais que fizeram de tudo para tê-lo arrancado de sua boca, agora, no fim do conto, gargalhando por conta da ignorância repressiva, incapaz de saber que o fato completo nada mais é do que um prato típico de Luanda, que a mulher de Lucas Matesso ficara de lhe enviar.
“A gargalhada grande como as chuvas de abril engrossando mais os rios cantou na garganta dele, encheu a cela de alegria, fugiu no postigo, pelos arames da rede, entrou maluca nos gabinetes onde os irmãos agüentavam as pancadas e torturas, calou os pássaros no jardim e, com um salto, voou por cima dos muros da prisão, correndo livre pelas areias de todos os musseques da nossa terra de Luanda.”
Pois é justamente em um musseque de Luanda que se passa uma história emblemática do futuro projetado de Angola na visão de Luandino, representado na “estória da galinha e do ovo”.
O conto narra a disputa travada entre duas vizinhas quanto à posse de um ovo. Cabíri, galinha de Zefa, botou o ovo no quintal de Bina, originando a contenda, que, iniciada, chama a atenção dos companheiros e conhecidos, que vão ao local para auxiliar na resolução do conflito. Acorrem a vavó Babeka, mais velha e dotada de sabedoria, o sacristão, o escriturário e o dono da venda, sem que nenhum deles consiga pôr um ponto final na questão. Quem encerra o caso é a polícia, que, além de chegar de modo truculento, pretende levar a galinha para fazer um churrasco. Dois meninos a salvam. Conhecedores da linguagem dos animais, que um dos mais velhos lhes havia ensinado, imitam o canto de um galo, o que põe a ave em alvoroço e lhe dá forças para desvencilhando-se do policial que a segurava, partindo em liberdade. A mulher dona da galinha dá o ovo à outra, que estava grávida, encerrando a disputa.
Percebemos tanto num conto como no outro um aspecto metonímico muitíssimo bem elaborado, o que dá aos personagens uma qualidade estética muito além da simplificação promovida por alguns adeptos do neo-realismo.
Em “O fato completo de Lucas Matesso” podemos ver a geração de homens maduros que se encontra cercada pela repressão portuguesa, depauperada, marginalizada, obrigada a habitar os musseques, sem emprego mas com disposição para o confronto com o aparato repressivo. São os guerrilheiros do MPLA, os sindicalistas, intelectuais e ativistas que lutam pela independência de Angola. Eles darão suas vidas se for preciso para que o futuro do país seja diferente. E o futuro do país são as crianças de “A história do ovo e da galinha.” Elas, mesmo que sintam a ausência dos pais encarcerados, têm neles a referência de bravura necessária para os momentos de confronto com a repressão. Além disso, estão atentas aos ensinamentos dos mais velhos, não descuidam das tradições africanas, pois são elas, as tradições, que lhes dão identidade e sabedoria para a vida. Vida nova representada no ovo, ou seja, é a própria Angola que está em questão. Nas figuras do sacristão, do escriturário e do dono da venda podemos ver os três principais poderes de Angola: a Igreja, o Estado e a burguesia, incapazes de responder aos problemas da população pobre. Mas no futuro de Angola eles não cabem. Apenas os humilhados e ofendidos dos musseques desfrutarão de uma nação sem religião, Estado ou classe social: uma nação comunista.

sexta sem prosa: só sombra e água fresca

Casa no campo
(Zé Rodrix e Tavito)

Eu quero uma casa no campo
Onde eu possa compor muitos rocks rurais
E tenha somente a certeza
Dos amigos do peito e nada mais
Eu quero uma casa no campo
Onde eu possa ficar no tamanho da paz
E tenha somente a certeza
Dos limites do corpo e nada mais
Eu quero carneiros e cabras
Pastando solenes no meu jardim
Eu quero o silêncio das línguas cansadas
Eu quero a esperança de óculos
E um filho de cuca legal
Eu quero plantar e colher com a mão
A pimenta e o sal
Eu quero uma casa no campo
Do tamanho ideal, pau-a-pique e sapé
Onde eu possa plantar meus amigos
Meus discos e livros
E nada mais...

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Brasil, Um País De Todos

O fim do século XIX no Brasil é marcado por dois grandes acontecimentos: a abolição da escravatura e a proclamação da república. Esses dois eventos estão intimamente relacionados em diversos pontos ideológicos, e no que diz respeito a visão da sociedade branca sobre o negro, as relações se estreitam da mesma forma. Conforme podemos observar, os negros apresentaram diversas formas de resistência à escravidão que lhes foi imposta, sendo inverídico dizer que foram elementos passivos na construção do processo abolicionista. Em meio a crescentes revoltas e fugas de escravos, a sociedade branca letrada procurava meios de manter a ordem frente a nova conjuntura social que se formava. A escravidão, vista como característica de atraso perante as nações internacionais, deveria deixar de existir através do movimento abolicionista, coordenado por brancos que estabeleceriam a ordenação da sociedade sem que o elemento negro interferisse de alguma forma. Com o fim da escravidão no Brasil, surge a dúvida do que fazer com o contingente de negros que existia. Várias idéias surgem em concomitância com as teorias científicas que ganhavam destaques pelo mundo. O positivismo dava força às ciências naturais como forma de organização social, permitindo que teses como o darwinismo adquirissem destaques na mentalidade da época. O negro, visto como elemento desordeiro, ladino e libidinoso, deveria ser contido de alguma outra forma que não a escravidão. Com o desenvolvimento do país como república, dever-se-ia buscar meios de coerção da sociedade negra, impedindo que as características “naturais” de atraso dessa população contaminasse a trajetória do país como potência. Num primeiro momento, os jornais da época retratavam diariamente a violência que circundava a vida dos negros, transmitindo a idéia de povo desorganizado, perigoso e atrasado frente à civilização branca. O texto de Gislene Aparecida dos Santos, intitulado “A Invenção do ‘ser negro’”, constrói bem a forma como os periódicos retratam o negro. Constata-se que após certo tempo, os jornais cessam de reproduzir o discurso do atraso da população de cor. “O negro vai paulatinamente sumindo de suas páginas, como se a paz entre as raças houvesse sido alcançada. (...) Já havia uma imagem naturalizada que tornava desnecessário o uso de mais palavras para definir o ser negro” (SANTOS, 2005, p. 132). Essa “paz entre as raças” de que a autora fala, configura-se na intenção de manter a ordem e visar o progresso para a nação brasileira. Suprimido o conflito após a configuração de uma hegemonia ideológica branca, começa a elaboração do discurso sobre a miscigenação presente na constituição do ser brasileiro. Destacam-se dois desses discursos que, visando um maior controle social, conseguem atingir grande exponencial na sociedade da época. O primeiro deles, identificado na figura de Nina Rodrigues, falava da diferença natural entre as diversas raças que compunham o brasileiro. O negro seria pertencente a uma raça primitiva, apegado às necessidades naturais, aos instintos que o dominariam e o levariam inconscientemente a cometer ações consideradas criminosas pelas raças superiores. Neste sentido, o negro (e também o índio), não poderia ser julgado e condenado pelas mesmas leis que seriam aplicadas aos brancos, pois cometer crimes é algo natural de sua índole. “Tanto os negros quanto os índios têm direito a uma responsabilidade atenuada no pensamento liberal. A relativização da responsabilidade penal significa, em outros termos, a relativização do direito à cidadania, à liberdade, à humanidade, e a conclusão, enfim, de que tanto os índios quanto os negros não podem ser considerados plenamente humanos” (SANTOS, 2005, p. 144-145). Essa desumanização do negro acabaria por gerar a identificação do atraso do país como uma conseqüência do povo que o compunha. A idéia transmitida por Nina Rodrigues é de que o mestiço seria uma degenerescência da raça branca, que herda a índole preguiçosa e atrasada do africano, refletindo esse atraso no desenvolvimento do Brasil. Assim, o único meio de amenizar essa deficiência seria isolar os negros dos brancos, dividindo as raças por meio da regionalização do país. Isso pode ser observado nos diversos movimentos revoltosos que eclodiram nessa época e que foram suprimidos pelo governo. Os presos das revoltas da Vacina e da Chibata eram transferidos para o Acre, ou internados em hospícios, instituição essa que se proliferou largamente no início do século XX. Outro discurso de grande influência na sociedade brasileira foi o de Gilberto Freyre. Divergindo de Nina Rodrigues no que diz respeito a visão puramente biológica das raças, Freyre analisa a miscigenação sob aspectos de natureza social, vendo-a como algo benéfico, “um corretor das distâncias sociais e do profundo hiato cultural entre o branco e o indígena, entre o senhor e o escravo ou liberto, entre o civilizado e o bárbaro, entre a casa-grande e a senzala”(SANTOS, 2005, p.150). O negro continua sendo inferior ao branco, emprestando somente suas características mais “interessantes” à formação de um ser aperfeiçoado, que geraria uma sociedade mais democrática em termos de raças, visto ser fruto de uma mistura. “O negro torna-se parceiro natural para a união pelo sexo e pelo trabalho. A díade senhor-escravo parece ser a representação do duplo perfeito, indissociável. O senhor representando a força, a virilidade, a brancura, a inteligência, o engenho, a crueldade sádica; e o escravo, a doçura, a sensualidade, o negror, a esperteza, a passividade masoquista” (SANTOS, 2005, p.154). A permanência das idéias de Gilberto Freyre pode ser percebida até hoje em nossa sociedade. O sentimento de falsa democracia racial constantemente tem sido revisto por órgãos e mídias para que o discurso de uma “igualdade” encobridora do racismo não se imponha como ocorrido anteriormente. O sentimento paternalista, do branco iluminador do negro passivo, ainda é encontrado em propagandas, livros e outros meios de comunicação de maneira maquiada, revelando um Brasil carnavalesco, convidativo, com ginga “futebolesca”, em que o negro atrai o turista para o país, mas não ocupa cargos profissionais, nem participa de maneira eqüitativa nos veículos de comunicação.

quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

Quarta MeiaEntrada - Discão da semana

Boi devidamente morto (certo Ivan?), vamos ao texto.


Antes dessa banda, o Rock era considerado um gênero menor, sem possibilidades mais criativas. Essa banda inglesa é com certeza o maior divisor de águas do Rock que já existiu. O seu primeiro disco, lançado em 1967 foi influencia fundamental para bandas como Black Sabbath, Dream Theater, Sepultura, Nirvana, entre outras. Inclusive o disco em questão aqui (que não é o primeiro) era, segundo Kurt Coubain o melhor disco de Rock de todos os tempos. Essa banda passou por diversas formações e fases, sendo que a melhor fase foi a primeira, de 1967 a 1974, data do lançamento do último disco antes que a banda entrasse num hiato e voltasse a gravar só na década de1980. Nesse disco, a formação era um trio, com John Wetton (Baixo/Vocal), Bill Bruford (Bateria) e o líder e único membro presente em todas as formações da banda, Robert Fripp (Guitarras), ainda contando com uma Viola e um Sax na maioria das faixas. Um dos maiores méritos dessa banda está latente na faixa “Fracture” onde a música é improvisada na hora. Esse improviso, que dava tons jazzísticos a banda foi sempre o grande diferencial na música do King Crimson.
O Álbum: Red
Não me vejo em condições de concordar plenamente com Kurt Coubain, mas com certeza a última faixa desse disco, “Starless and Bible Black” é umas das melhores canções do Rock da História.