Considerado por alguns um dos melhores jornalistas que o Brasil já teve, Cláudio Abramo (1923-1987) conseguiu um feito para poucos na área: manteve um espírito crítico ao ofício ao mesmo tempo em que ocupou cargos importantes em grandes veículos de comunicação. No livro “A Regra do Jogo”, temos, orientados por aproximação temática, uma seleção de textos do autor publicados na imprensa e intercalados por opiniões dele a respeito da profissão. Profissão que, aliás, ele preferia chamar de ocupação ou carreira. Responsável pela modernização dos jornais O Estado de S. Paulo e Folha de S.Paulo, ocupando o cargo de chefia da redação dos dois periódicos, nem por isso ficou cego às características peculiares do ambiente em que trabalhou.
“Em quarenta anos de jornalismo, nunca vi liberdade de imprensa. Ela só é possível para os donos do jornal. (p. 116)”
Quer mais?
“Também havia uma pressão muito forte contra mim por parte de oficiais do Exército que estavam conspirando com os Mesquita. (p. 93)”
“O fato de minha posição ideológica ser conhecida nunca atrapalhou em nada. Aliás, o dr. Julinho [Julio de Mesquita Filho] me queimava muito. Quando aquele pessoal que sempre conspirou visitava o jornal, ele, para exemplificar o liberalismo da casa, dizia que o secretário era trotskista.” (p.31)
“Houve um período em que não se podia acreditar em nada que saía impresso; era publicado nos jornais que um guerrilheiro tinha morrido atropelado, quando na verdade tinha morrido numa cela, sob as torturas mais bárbaras. (p. 120)”
Claudio Abramo não concebia uma terceira-via, mas buscava conciliar alguns aspectos das sociedades capitalistas avançadas e dos Estados socialistas.
“Inventaram que as ideologias morreram, mas as pessoas têm objetivos que se encaixam nesta ou naquela ideologia. O sujeito tem que ser comunista ou fascista. Não há meio termo.”
Haverá aqueles que verão nisto as marcas da guerra-fria, em que, de fato, um meio-termo era quase impossível. Porém, para além de seu tempo, entretanto, Claudio Abramo antecipou o dilema das esquerdas atuais, ao defender “a liberdade de manifestar-se, de fazer greve, de organizar-se em partidos, de estar ao abrigo das leis de exceção, de proteger-se eficazmente contra a autoridade abusiva do Estado, de ler o que quer, de pensar o que lhe der na telha, de viver como lhe apraz" ao mesmo tempo que um "Estado distributivo e coletivista".
Muitos afirmam que desde a queda do muro de Berlim as esquerdas estão buscando uma conciliação entre liberdade e justiça social. Tenho pra mim que se pode recuar ainda mais. Desde o relatório Kruschev, pelo menos, a questão foi posta e até hoje não se encontrou uma respota convincente. O jornalista também se encontra numa situação espinhosa, ao dividir-se entre a obrigação moral de informar para um mundo melhor, ao mesmo tempo em que sabe que o produto de seu trabalho é uma mercadoria, sujeita aos mandos dos patrões. Liberadade total e justiça social, assim clamou Claudio Abramo. Assim pedimos todos nós.
sexta-feira, 4 de janeiro de 2008
Jornalismo, Liberdade e Justiça
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